quinta-feira, 24 de maio de 2012

Amarelo-ovo

(Por Delianne Lima)

E o sabor de cointreau pairava no ar, mas não mais que o cheiro de cigarro dos seus dedos.

Noêmia não parava de fumar.

O nervosismo vinha da expectativa de sempre: o bendito carro amarelo. "Enquanto aquele carro amarelo não passar, não vou dormir. Não dá". Um, cinco, vinte minutos. O piscar de olhos e seu cigarro já não eram mais os mesmos. Multiplicavam cada vez mais. Noêmia tinha problemas. Problemas de TOC, de toque. Pintava a boca de vermelho, mas nada mudava. Sua alma continuava incolor.

E então vislumbrava o carro amarelo. Aquele fusca velho, abatido. Quase que não conseguiam andar, os dois. Trêmula, Noêmia desceu as escadas, tentando alcançar o amarelo-ovo andante. Mas cadê? Sua vida já não tinha portas alcançáveis. Estava presa ali, naquele quarto, naquela escada. Tenta bater na porta, sem sucesso. Tudo que consegue é forçar um sorriso.

Está presa por trás de seus olhos. Sua alma incolor ligou o carro e deu a partida.

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